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Criei este blogue com a ideia de o rechear com estórias rutilantes, ainda que às vezes embaciadas. Penso que são escritas sagazes e transparentes, embora com reservas e alguma indecência à mistura. No entanto, honestas.
Após quarenta anos longe da pátria, uma madrasta que o obrigara a sair da sua "zona de conforto e emigrar", ei-lo regressado à terra e à casa onde nascera; naturalmente expectante e com um enorme aperto no coração; sobretudo uma vontade desmedida de abraçar a família.
O homem morria de saudades; é compreensível. Ademais, ele pertencia ao rol daqueles milhares de portugueses que, desde há muitas gerações, se vão dispersando, um pouco, pelos quatro cantos do mundo; a eterna diáspora...
Havendo ajuntado um pé-de-meia suficiente para poder gozar a sua reformazinha junto das pessoas que mais amava, mais a mais, tendo ficado ausente delas uma eternidade, percebia-se perfeitamente o seu estado de ansiedade. Se fizermos bem as contas, chegaremos, quase todos, à proposição final de que quarenta anos não são quarenta dias, n'é verdade?
No entanto, para sua grande desolação, a mulher havia partido há vinte e quatro anos para a Alemanha, cansada de esperar e desesperar por ele durante dezasseis anos.
A filha, que tinha completado quatro anos quando ele abalou, saíra de casa há oito anos, depois que atingiu a maioridade e emigrara para a Suíça, trinta e dois anos após ele partir e oito anos depois da saída da mãe.
O filho, actualmente com cinquenta e dois anos, tinha vinte e oito anos quando a mãe perdeu a esperança de rever o pai e abandonou o lar, dezasseis anos depois dele, e não assistiu à partida da irmã, pois aos trinta e dois anos, quando ela completara vinte e quatro anos, ele partira para o Luxemburgo, vinte anos antes do regresso do pai.
Porém, desistiu de os procurar porque foi sempre uma nódoa a matemática.
- «Passas o dia agarrado à porcaria do telemóvel; faltas às aulas; não levas o cão à rua; não pegas num livro e não arrumas o teu quarto! - bradava-lhe a mãe, desesperada - Garanto-te que não vais continuar na boa-vai-ela, foi a gota d'água! Quando o teu pai chegar a casa, vais entender-te com ele, ouviste?»
O pai chegou, zangadíssimo com a puta da vida e com o trabalho duro mal remunerado: uma merda de salário que quase não dava para o tabaco. Pior do que isso, e por consequência, eram as idas cada vez menos frequentes, ao estádio do seu "glorioso"; isso é que o magoava sobremaneira.
Com a mulher aos berros a fazer queixas do rapaz, as coisas descontrolaram-se e o homem não esteve com meias medidas: entrou de supetão no quarto do puto e pregou-lhe uma cabeçada, mesmo no meio da testa, que o deixou meio zonzo.
Recomposto, apesar de vacilar ligeiramente, o jovem replicou pronta e eficazmente com um "uppercut", com salto mortal à retaguarda, e rematando com um excelente pontapé lateral, com a parte externa do pé, que pôs o paizinho a ver estrelas, planetas e cometas, não obstante estar uma noite de nevoeiro cerrado.
Sacana do fedelho, desde que trocara a catequese pelo "kickboxing", até parecia que se sentia mais desinibido!
- Quando tocou a campainha, os amantes, bestialmente frustrados por via do coito interrompido (não confundir com o método anticoncepcional do coito interrompido), mas também dominados pelo terror, estremeceram sob os lençóis:
«Meu Deus, Pedro, quem será a esta hora!? Ai, Pedro que desgraça a nossa!» - Exclamou ela que até era casada com Pedro.
A tradição anedótica faz-nos tirar ilações precipitadas. Penso que é um defeito cultural. Se não for, olhem, que se lixe!
- E eis-me regressado a uma coisa de que gosto muito: a "criatividade literária". Este é o meu segundo blogue. O anterior "jaz morto e arrefece". Espero que desfrutem, senão, olhem, "desculpem qualquer coisinha!"
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