Olha, aqui, bate-se o dente porque o aquecimento central está sempre avariado, filha! Nem debaixo das mantas consigo aquecer! Ademais, o Horácio vem sempre prá cama c'os pés frios q'até parece que está morto, o raio do homem, credo!
Faz tempo que não te escrevo e, às vezes, até fico toda ralada com vocês, mas que é que tu queres? Sabes que sempre fui muito distraída. Depois, parece que não tenho tempo pra nada!
Dá-te por muito feliz por me lembrar de ti só nestas alturas porque há gente que nem na Páscoa, sabes lá! Aliás, este ano, tampouco no Natal; é uma tristeza o que este maldito vírus está a fazer à gente, filha!
Também te escrevo para te dar uma novidade que, certamente, te vai alegrar. Pois, então, aqui vai: Já não sou republicana, prima, não é uma boa novidade? Isto foi uma coisa que foi enchendo, enchendo e pronto, tinha de sair por algum lado, senão eu rebentava!
Gostava imenso que a monarquia voltasse outra vez e sabes, ainda tenho a esperança de ver o nosso rei, Dom Sebastião, regressar de Alcácer Quibir numa manhã de nevoeiro; é cá uma fezada que tenho; tu nem calculas, prima!
Acho que devia haver um referendo a perguntar às pessoas se querem um rei ou se querem continuar com aquele selfista compulsivo, sempre a fazer caretas e aos beijinhos. Agora, só se safa com beijinhos de coco e viva o velho!
Além de que este país com um rei era outro asseio e uma coisa vitalícia! Ai, e o nosso querido Dom Sebastião era um santinho, prima, não achas? Coitadinho, sabe Deus quanto sofrimento padeceu às mãos daquele turco maluco, o Mulei Moluco!
Olha, diz-me cá outra coisa: tu não achas que o Dom Duarte Pio devia concorrer à Presidência da República? Se o André Ventura e o Tino de Rans são candidatos, não encontro razão para que o Duque de Bragança não possa fazer o mesmo! Se ganhasse, pronto, já estava! Ficávamos todos marqueses e marquesas e acabava-se a poluição que é uma coisa que só há nas repúblicas. Se calhar passávamos a andar a cavalo e íamos para as santas cruzadas matar infiéis. Ai, era tão bonito! Agora que eles andam muito saídos da casca, a degolar por dá cá aquela palha, até os comia vivos, prima, que raiva!
Bem, mas, na melhor das hipóteses, isto só pode mudar depois da guerra porque a situação está muito má, até mesmo para as guerras.
Então, tu não soubeste que o Trump andou a espalhar aos sete ventos que podia haver uma guerra atómica lá para os lados do Irão?! Por via disso até já declarou, unilateralmente, Jerusalém como a capital de Israel, já viste? Ainda bem que é longe! O que nos vale é que os sefarditas são pessoas mais evoluídas do q'a gente, n'é? Podem ser um bocadinho safaditos, não nego, mas têm muita prática de guerras e isso tudo, o q'até dá muito jeito!
Acho que uma guerra não é pra todos; é preciso ter uma boa estrutura mental para aguentar o stresse de uma guerra, mais a mais atómica. No entanto, gostava muito que houvesse cá uma, já que o Benfica foi eliminado da "Champions League". Sempre eram mais uns euros que entravam nos cofres do "glorioso" e ajudavam a economia que bem precisada está, com o raio dos confinamentos, coitadinha! Fazia-se, desta forma, uma grande campanha nacional, tipo "Faça a guerra em Portugal, primavera todo o ano" ou "Make war in Portugal, spring time all year" (para inglês ver) ou ainda "Lance a sua bomba atómica na Costa da Caparica, de costas voltadas para o Barbas – passe a publicidade – e de peito aberto para as ondas revoltosas do mar encrespado". Que tal?
Acho que uma guerra atómica ia trazer turistas a Portugal que bem precisado está, prima! Até porque matava tudo; inclusive este maldito vírus e vacina pra que te quero?!. Depois, ficava a balança de pagamentos mais que paga. Assim, sempre a dever, até parece a Ponte 25 de Abril: a gente pinga para lá há mais de cinquenta anos, mas nunca mais paga o raio da ponte! É que, pelo menos, acabava-se com o tormento das moscas. Cá em casa são aos milhares, cruzes, canhoto!
Estive fartinha de pedir ao Horácio para comprar "Dum Dum" (passe a publicidade), mas ele respondia logo que eram menos dois copos de vinho que bebia na taberna do Isaías e sabes..., ele até tem razão, coitadinho, também não tem outras entretengas!
Vê lá tu que outro dia... as conversas são como as cerejas; umas arrastam as outras e vai tudo a eito ou a torto e a direito... dizia eu que o meu Horácio estava a falar com o patrão lá no trabalho...ah, não te disse: o Horácio tem um emprego novo, daqueles sem contrato a prazo. Se não trouxer nada para casa, para além do que o patrão lhe paga, pode ser que fique a trabalhar mais uma semanita; estou muito esperançada em que ele não caia em tentações, prima, vamos ver... ele é tão inseguro!
Mas, como te dizia, um dia destes estava a falar com o patrão e não é que se assoou à gravata?!
Mas, olha, do mal o menos; cada um assoa-se ao que é seu e ninguém tem nada a ver com isso, n'é verdade? O chato é que ele assoou-se à gravata do patrão porque, coitado, tinha-se esquecido do lenço e era uma tremenda falta de educação assoar-se para o chão; cá em casa é uma porcaria, filha! Por muito que me esfalfe a esfregar o chão, não consigo tirar as nódoas; tu nem calculas! Agora imagina o molho de brócolos em que se ia metendo o meu Horácio. O que lhe valeu foi que, como te disse, ele não tem contrato a prazo senão já tinha sido posto no olho da rua. É o que faz a gente ser distraída!
Ainda a propósito do "Dum Dum": insisti tanto com ele que, contrafeito, lá acabou por ir comprar o estupor do mata-moscas, mas como é um cabeça de alho chocho, trouxe um martelo! Eu também não reparei e olha, pôs-se a matar as moscas à martelada e escavacou a mobília toda. Achas que o meu homem está bem do tino? O pior foi a avó Felisbela que estava a passar pelas brasas na poltrona.
A pobre tinha uma mosca pousada na testa e ele não foi de intrigas; distraidíssimo como é, deu-lhe uma martelada que a pôs a falar estrangeiro. Ao menos, se o raio do insecto tivesse pousado no nariz, faria menos estragos! Mas, olha, o bicho teve morte instantânea e sem sofrimento, graças a Deus!
A avó Felisbela, coitadinha, é que não se cala; até parece que está ligada à corrente! Tivemos, inclusive, de chamar o endireita, mas o melhor que conseguiu foi pô-la a falar eslavo. Sempre é melhor que estrangeiro, não achas? Também ficou com um hematoma, mas penso que pode ser do reumático. Sim porque de reumático sofre o nosso país! Nunca mais entramos para a Europa, credo! Não é que eu deseje mal aos outros, mas quem deve entrar primeiro são os europeus e depois, por ordem de chegada, a gente, os vândalos, os suevos, os cartagineses, os otomanos, os australopitecos e os gregos.
Ai, os gregos, coitadinhos, eles que são o berço da Europa, têm-se visto gregos com o seu crescimento! Esta Europa é tão velha e, no entanto, tão imatura, valha-lhe Deus!
E pronto, priminha, por hoje é tudo. Desejo-vos um santo Natal e tu recebe muitos beijinhos desta tua prima que te estima e s'assina,