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O CENTRO DE SAÚDE DA MINHA FREGUESIA

por João Castro e Brito, em 29.08.14

luto1.jpg

Hoje, desloquei-me ao centro de saúde da minha freguesia. Tenho mais de 90 anos. Disseram-me que durante os meses de Verão não aceitam marcações de consultas por telefone.
Não vale a pena ligar para o centro de saúde da minha freguesia nos meses de Verão. Os meses de Verão são para respeitar, pronto e ponto!
Por conseguinte, peguei nas minhas pernas que, apesar do desgaste dos anos e um pouco trôpegas, ainda estão capazes de me levar ao centro de saúde da minha freguesia.
A pessoa que me atendeu, a que enfaticamente se dá o nome de "médico(a) de família", perguntou-me de que me queixava:
«Olhe, doi-me aqui e ali. Além disso, tenho tonturas; urino aos pingos; tenho zumbidos nos ouvidos; sinto náuseas e não sinto prazer em viver!».
Enquanto me escutava ou penso que me escutava, perguntou-me que remédios tomava, mediu-me a tensão arterial, gabou-me a provecta idade, receitou-me mais comprimidos e requisitou exames, enfim, a regra a que me fui habituando ao longo dos meus já longos anos. Depois, disse-me para me deslocar ao centro de saúde da minha freguesia, assim que tivesse o resultado dos exames na mão.
Assim fiz, passados que foram 30 dias, mais dia menos dia, após a marcação da consulta e com os exames na mão.
Chegada a minha vez de ser atendido, depois de três horas de espera, a pessoa que me recebeu, perguntou-me de que me queixava, mediu-me a tensão arterial, gabou-me a provecta idade, e quis saber se eu estava a ser medicado:
«Bem..., são as queixas recorrentes: umas dores aqui e ali; as tonturas persistentes; a urinação aos pingos; a agravação dos zumbidos nos ouvidos; as malditas náuseas e o desprazer da vida.
Aqui tem os exames que pediu. Quanto aos remédios estou a tomar aqueles que costumo tomar e outros tantos que me receitou.» - ao que retorquiu não ter a certeza de mos ter prescrito...
Enquanto mirava e remirava os exames, não sei se com atenção, disse-me para ir ao centro de saúde da minha freguesia, no dia seguinte, com o nome dos remédios que me tinha indicado.
Assim fiz. Agarrei nas minhas pobres pernas e fiz o percurso que elas conhecem tão bem, para mostrar à pessoa que me tem atendido, o nome dos remédios que me receitou. Assim que me recebeu, passadas que foram mais de três horas de espera, veio com a conversa repetida: de que me queixava, mediu-me a tensão arterial, gabou-me a provecta idade e quis saber que remédios estava a tomar. E eu, é claro!...

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O COCÓ

por João Castro e Brito, em 25.08.14

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Era uma vez um cocó feiarrão e fedido, cagado a esmo, como se tivesse sido largado por um cu imoderado, inculto e, pior que tudo, totalmente desprovido de sentimentos.
Um ânus anónimo, medonho e de uma insensibilidade cruel, expulsara-o da tripa grossa, tirando-o da sua "zona de conforto".
Depois desse triste episódio já nada seria como dantes; tudo mudara para ele. Coitadinho, tinha vindo ao mundo, tal e qual, sem um peniquinho, uma palmadinha nas costas, um calorzinho humano; nada de nada! Que maldade!
Ali ficou, sozinho, evacuado ao acaso, sujeito a um ou outro pé menos atento que o pudesse pisar ou a uma pá e uma vassoura inflexíveis; sem amparo nem carinho, sem algo ou alguém que lhe desse algum alento. E tudo o que ele afinal queria era conversar, fazer amigos! Mas qual quê! Quem passava por ali só queria evitá-lo: «Porra! Quem cagou aqui?» - Verberavam este e aquele, evitando escorregar no pobre.
«Cuidado, não pisem a merda!» - Vociferavam outro e aqueloutro, ainda a tempo de evitarem o que parecia inevitável.
Afinal, o cocó ansiava apenas por uma atenção especial; era um cocó com carências afectivas que diabo! Era pedir muito, gostar de um cocozinho?!
Um dia viu uns senhores e umas senhoras, muito janotas e muito enfatuados nas maneiras, aproximarem-se e, adivinhando que ia levar com os impropérios a que estava acostumado, tentou, o melhor que pôde, reter o cheiro fétido para não incomodar os seus delicados narizes. E não é que, para sua surpresa - agradável, por sinal - , em vez de impropérios dirigiram-lhe sorrisos, olhares cúmplices e palavras de conforto!? Nunca o cocozinho se sentira tão feliz e contente (perdoe-se-me a redundância)!
A partir daquele extraordinário e afortunado acontecimento ia poder gozar, finalmente, de todas as prerrogativas que lhe tinham sido sonegadas durante tanto tempo de contenção graças à generosidade e sentido democrático daquelas pessoas importantes que o passaram a acarinhar e, coisa inédita nos anais (não confundir com o étimo latino anus) da história, foi nomeado Secretário de Estado do Ambiente e agraciado por Sua Excelência o Senhor Presidente da República com a grã-cruz da Ordem da Merdice.
Finalmente, o cocó pôde ufanar de alívio e deixar de ser aquele infeliz rejeitado e mal cheiroso que todos expeliam, naturalmente, pelo ânus, pois aquelas almas gentis souberam reconhecer o seu mérito, identificando-se com ele, irmanados no mesmo espírito fraterno. Nem tudo está mal em Portugal. Esta mania tão nossa de desdenhar de tudo e de todos, irra q'até chateia!

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IMPOSTO SEXUAL

por João Castro e Brito, em 21.08.14

imposto sexual.jpg

O Secretário de Estado do Orçamento afirmou há algum tempo que o orçamento rectificativo com as medidas para compensar o desvio orçamental deste ano está nos propósitos do Ministério das Finanças no sentido de minimizar os efeitos da grave crise que o país atravessa constituindo esta alteração a maior novidade no campo das medidas económicas a tomar pelo Governo ligeiramente à margem do memorando da "troika".

Esta foi à Saramago! Deixem-me recuperar o fôlego...
Com efeito, não obstante a grave crise económica internacional e o brutal défice externo, estudos (estudos, estão a ver?) apontam para o facto de os portugueses continuarem a praticar sexo com alguma regularidade, embora nem sempre nas melhores condições. Temos, pois, que englobar outras práticas de sexo que não somente e apenas (passe a redundância) as praticadas geralmente por pares. Também essas serão taxadas, caso esta alteração venha a ser aprovada pela maioria e passar pelo crivo do Tribunal Constitucional. Afinal, trata-se de uma actividade generalizada a todas as camadas sociais, sendo esta a razão fulcral pela qual o Governo considera este novo imposto como o mais equitativo e justo (desculpem lá, outra vez, o estupor da redundância).
Temendo que os portugueses deixem de ter relações sexuais para fugir ao imposto ou tentem praticá-las à revelia do fisco, o Executivo vai lançar uma campanha de sensibilização da opinião pública, nomeadamente com "spots" publicitários institucionais, no canal 2 da televisão do Estado, em que dois jovens praticam sexo puro e duro enquanto preenchem o impresso electrónico no Portal das Finanças.
Estão também previstos cartazes que serão afixados em locais públicos bem visíveis onde surgem os mesmos jovens, muito suados e despenteados da "refrega" coital, a afirmar alegremente: "Gozámos à brava porque cumprimos as nossas obrigações fiscais!".
No entanto, apesar desta medida de largo espectro social poder vir a render alguns milhões de euros aos cofres do Estado, a situação continua a ser preocupante. As taxas de juros poderão aumentar de muito altas para altíssimas; o PIB poderá ser extinto; as pensões de reforma poderão ser substituídas por mitras; o abono de família poderá ser retirado a todas as crianças que contraiam sarampo, rubéola ou varicela; o crédito à aquisição de habitação própria poderá ser restringido aos cidadãos que tenham pago a casa a pronto, et cetera.
Em face deste cenário tão calamitoso, vislumbra-se uma situação deveras negra, deixando adivinhar um 2015 bem pior que o que decorre, embora a ministra Luís Albuquerque teime em classificá-la de cinzenta, pelo que parece confirmar a tese que muita gente já temia: A gaja sofre de daltonismo...
P.S.: A talhe de foice e somente por curiosidade, vocês sabem que daltonismo provém de um tipo chamado John Dalton que era um daltónico do caraças?

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AUMENTOS EXTRAORDINÁRIOS E OUTRAS REGALIAS

por João Castro e Brito, em 01.08.14

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Os deputados do Cagaristão decidiram, por maioria significativa, conceder a todo o povo cagaristanês aumentos extraordinários e outras regalias, designadamente, entre demais elevados estipêndios, pensões-completas, vitalícias, em todas as unidades hoteleiras de cinco estrelas do país, subsídios de desemprego para pessoas empregadas e subsídios de férias para pessoas desempregadas. No entanto, os deputados que votaram este magnânimo projecto fazem questão de não serem englobados nestas medidas de aumento bestial da qualidade de vida dos seus concidadãos.
"A nossa sublime missão é trabalhar para o bem-estar comum, conforme vem consignado na Constituição da República e não, exclusivamente, para nós, como tem sido até aqui. Por isso e por obrigação moral, entendemos não dever beneficiar das benesses, agora, prodigalizadas a toda a população" – declarou um dos autores da proposta aprovada por larga maioria na Assembleia da República do Cagaristão.
Ao tomar conhecimento, através dos média, da decisão dos deputados daquela nação, o povo não ficou contente e tratou de organizar grandes manifestações com a exigência de que os deputados também fossem abrangidos pela concessão de aumentos extraordinários e outras regalias.
"Para deputado igual, salário igual" – lia-se em alguns cartazes.
O Presidente da República do Cagaristão não deixou de manifestar o seu desagrado com a atitude dos deputados, lembrando que está escrito na Constituição que "todos os cagaristaneses são iguais perante a lei. Por conseguinte, têm os mesmos direitos, deveres, liberdades e garantias. Portanto, não faz sentido – ainda segundo as palavras do mais alto magistrado daquela nação – que os deputados insistam em continuar na miséria enquanto o nível de vida do povo sobe a olhos vistos!"
Também, outros sectores mais à direita do espectro político, se mostraram dispostos a colocar objecções. Um dos seus representantes parlamentares teria, mesmo, considerado excessivas, as novas regalias concedidas a todo o povo cagaristanês, em contraste com o agravamento das condições de vida dos deputados.
"Respeitamos, naturalmente, o seu desejo de austeridade – disse – mas não é justo que recusem o passe-social e o tíquete de restaurante, prontos!
Sendo a situação económica actual do país, de grande desafogo, entendemos que todos devem beneficiar, inclusive nós."
"Só por cima dos nossos cadáveres! – disse um dos subscritores da inédita medida social, enquanto outro complementava:
"A nossa política é simples: pãozinho para o povo e migalhas para nós!"
Nos últimos dias, alguns deputados mais sensíveis à indignação popular, admitiram a hipótese de poderem vir a usufruir de alguns dos aumentos e regalias concedidos, mas sublinham que não se deve ultrapassar a fasquia dos cinquenta e cinco vírgula cinco por cento, salientando que, mesmo assim, já é um valor muito superior à inflação.
Em contrapartida, os deputados autores da medida exigiram para si novas medidas de austeridade, insistindo em pagar todos os bens de consumo, de capital e demais bens a preços exageradamente altos.
Entretanto, o povo cagaristanês não se conforma com a excessiva pobreza em que vegeta a sua classe política e um seu porta-voz criticou a austeridade do Parlamento nos seguintes termos:
"O que os deputados do Cagaristão querem fazer, é uma verdadeira greve de fome, mas o povo jamais alimentará esta obsessão altruísta! Assim, vamos para a rua marchar a toque de caixa e corneta, vão ver!"
Nota de autor: assim Portugal tivesse políticos desta dimensão tão humana!

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