Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]

QUE CORAGEM! É D'HOMEM!

por João Castro e Brito, em 22.05.24

Gouveia e Melo: "Se a Europa for atacada e a NATO nos exigir, vamos morrer onde tivermos de morrer para a defender."
Fonte: Diário de Notícias
 
Entretanto, uma porta-voz do Kremlin já veio dizer, alto e bom som, que Portugal não pode c'uma gata pelo rabo, não tendo, por isso, submarinos suficientes para enfrentar a armada do Czar. Quando muito, meia dúzia de corvetas já obsoletas, outras tantas corvinas a precisar de restauro e alguns carapaus de corrida.
Concluiu, dizendo que o Almirante é um romântico compulsivo; que o nosso país se anda a portar muito mal; que está subjugado aos interesses da NATO e da UE; que as relações com a Rússia nunca estiveram tão mal; que assim não pode continuar e, por conseguinte, a importação de rolhas de cortiça vai ser revista em baixa e que isto, aquilo e aqueloutro.
Vamos esperar pelos próximos desenvolvimentos. É que a coisa pode gerar uma salada russa de proporções incalculáveis!

Autoria e outros dados (tags, etc)

LEONARDO DA VINCI E MONA LISA

por João Castro e Brito, em 22.05.24

leonardo da vinci e mona lisa.jpg

O trabalho Mona Lisa (Lisa Gherardini?) de Leonardo Da Vinci, teve início em 1503 – segundo a Wikipédia que eu, de factos cronológicos, pesco zero – , tendo sido concluído três ou quatro anos mais tarde. Sinceramente, cá o je, leva muito mais tempo pra concluir seja o que for! A coisa tem de ficar perfeitinha. Mas é normal porque, ao pé de um totó como o Leo, eu sou um génio. Adiante.
É nesta obra que o artista melhor concebeu a técnica do "sfumato", que não sei bem o que é, peço desde já desculpa pela minha elevada ignorância, mas também não é esse o objectivo deste meu rabisco: explicar técnicas de pintura. Ademais, renascentista? Era o que faltava! Pesquisem, se fazem favor! Prosseguindo: O quadro representa uma mulher com uma expressão deliciosamente introspectiva e um pouco tímida até. Segundo os cronistas de antanho, uns soalheiros do caraças, parece que a pobre andava com a cabeça à razão de juros, pois vivia no sonho de encontrar um amor (era casada...). Como assim que tanto o procurou que desesperou e perdeu a cabeça. O amor, através dos tempos, foi (e é) sempre muito parvo: fez (e faz) as pessoas atirarem-se de cabeça; darem com a cabeça nas paredes; andarem com a cabeça à roda e o diabo a quatro.
É claro que há boas e raras excepções, mas – olhem – não concordo nada com aquela cena do amor perdurar enquanto durar. Que é lá isso?! São malucos ou quê?
Divaguei de novo. Prossigamos:
Como dizia, o sorriso da Mona Lisa (ou Gioconda) é de uma sedução quase comovente, mesmo que, aparentemente, um pouco difícil de perscrutar.
O quadro de DaVinci é, talvez, o retrato mais famoso da história da arte. Pelo menos é o mais badalado, cobiçado e sobre o qual se têm escrito histórias cheias de pressupostos acerca da personagem pintada por ele. Poucas são as obras de arte que têm gerado, ao longo de gerações, tantas paixões e controvérsias.
Muitos historiadores de arte são da opinião de que a reverência supostamente obsessiva de Leonardo Da Vinci pela graciosidade desta misteriosa mulher estava relacionada com a surpreendente semelhança com um jovem, alegadamente belo, Salaí, um dos seus dois assistentes, por quem o pintor se havia apaixonado. Verdade ou mentira, só Deus sabe. E aqui se retorna ao ponto de partida que é, ao fim e ao cabo o motor principal da nossa existência: o amor, a sua transversalidade e as suas incongruências.
Ao ponto de perdermos a cabeça...

Autoria e outros dados (tags, etc)

LOUVAÇÃO DA RUA

por João Castro e Brito, em 10.05.24

louvação da rua.jpg

Nesta cidade assustada há uma rua que permanece imune às punições da corrupção e da cobiça. Fica paralela ao Largo do Intendente e à Damasceno Monteiro e tem um nome feiote, cuja origem e história quero ignorar: Rua da Bombarda. Passeando a memória pelos seus velhos prédios, pelo recorte sombrio dos seus pátios interiores, pela taberna do Amador Puime Dominguez, pelos domingos com música de "Jazz-Band", pelo senhor professor Meireles, que estudava ornitologia e tentava cativar a malta para as alegrias da botânica – é como receber respostas a perguntas que não formularia sequer aos meus amigos mais íntimos.
Foi ali que o velho Bastos formou o seu clã, foi dali que, alguns de nós partimos, um dia, para viagens com e sem regresso.
Os Bastos nunca foram gente dada ao sentimento lacrimejante do passado: têm cumprido a ordem natural da vida, amado com alegria, lutado por uma porção de coisas e morrido com honra. Há um porém em relação à rua. A avó Maria deixou de lá ir quando soube que haviam deitado abaixo a fábrica de têxteis. A minha irmã Armelinda quis ver a rua horas antes de morrer. O velhote, uma vez interpelado sobre a sua nacionalidade, respondeu: "Sou da Rua da Bombarda". Não é um processo subliminar de se manifestar uma raivosa impotência ao avanço dos anos. É um acto de amor.
Na rua havia uma escola. Na escola, professor Meireles. Aprendemos todos alguma coisa com esse homem que amava a ornitologia, a botânica, as crianças – e a rua.
Numa tarde em que a Margarida, a miúda-eleita-de-toda-a-malta, copiava o ditado, pelo livro de leituras, o professor Meireles disse-lhe: "Olha que eu tenho olhos." "E por sinal bem bonitos, senhor professor!" – respondeu-lhe a Margarida.
Todas as ruas têm alma e todos nós temos na alma uma rua.
Quando o professor Meireles morreu, num fim de tarde sereno, as janelas removeram as cortinas, Amador Puime Dominguez cerrou meia porta, não houve música de "Jazz-Band", os pátios interiores ficaram mais sombrios – e fomos todos lá num regresso adulto. Todos. Todos em redor daquele corpo hirto, daquela face serena, daqueles olhos fechados.
Por sinal, bem bonitos, senhor professor...
 
Por Baptista Bastos
Lisboa Contada Pelos Dedos
Crónicas/2001
 
 
Quem não tem na alma uma rua?
Esta, de que vos conto, é a minha. Lembro-me dela como se fosse hoje. Era o meu território e o de um bando de putos de botas cardadas e calções remendados, do qual fazia orgulhosamente parte.
Lembro-me da Leta "ranhosa" que morava uns quatro quintais antes do meu. Chamávamos-lhe assim porque andava sempre com uma gota de ranho a querer pingar-lhe do nariz.
Lembro-me das nespereiras da dona Alice, a vizinha do lado, e de ela me alçar para o seu quintal quando a minha mãe me queria castigar por lhe ir às nêsperas; dos pessegueiros da Célia, dois quintais antes do meu, cheios de pêssegos amarelos; até dos ais cruciantes do senhor Eduardo, em luta inglória contra algum mal de que padecia; e do fogo na fábrica de cortiça, ali tão perto, que passei uma noite sem pregar olho; ainda dos gemidos das sirenes dos barcos em dias de nevoeiro; também do toque vibrante do relógio de parede da vizinha de cima, a dona Lídia, a soar de hora em hora; mesmo das brincadeiras, "patifarias" e outras peripécias próprias de crianças: brincar aos "cobóis" com pistolas de fulminantes; fazer fisgas para ir aos pássaros (confesso, com alívio, que nunca matei nenhum); ir à "chinchada" aos quintais da vizinhança; apanhar borboletas (pousadas) com o polegar e o indicador; meter lagartas das couves no bolso do avental da minha avó Maria; "brincar" com bombinhas, garrafinhas de mau cheiro, rabichas e triquetraques no carnaval e sei lá que mais.
Também me lembro de ver o Cristo Rei, a partir da minha rua. Penso que há muito tempo que já não se vê porque a minha rua ficou cercada por prédios altos.
Passadas décadas, lembrei-me de visitar a minha rua, numa espécie de romagem de saudade, e pareceu-me mais pequena; tudo me pareceu mais pequeno.
A propósito do Cristo Rei, lembro-me de a minha tia Rosa me ter levado a assistir à sua inauguração. Também, só muito mais tarde é que soube que o monumento havia sido "abençoado" pelo, então, Cardeal Cerejeira. Dizia-se que ele e o Salazar eram unha com carne...
Lembro-me de a minha mãe me ter comprado um brinquedo de lata, de eu o ter aberto pra ver se tinha alguma coisa dentro, e de ter desatado a chorar porque era oco. Também me lembro de, às vezes, o meu pai me trazer um chocolate, daqueles que saíam nas caixas de furinhos da Regina (passe a publicidade), e o "velho" sorrir para o ar de felicidade de um miúdo.
Lembro-me de ter sido operado à garganta e ao nariz, num hospital que já não existe e, após a operação, ter vindo para casa ao colo do meu pai.
Lembro-me de ficar em casa, sozinho, a tomar conta da minha mana caçula, enquanto a minha mãe ia trabalhar.
Lembro-me, ainda, quando ficava sozinho, de fugir de casa, quando chovia ou trovejava, por ter medo da chuva e da trovoada; da minha mana mais velha me pegar ao colo, sentada numa cadeira muito frágil e de termos caído; de ir com a Fernanda para a escola, cada um para a sua. Naquele tempo os meninos não se podiam misturar com as meninas.
Lembro-me de me baldar à missa aos domingos para ir ver filmes do Joselito e da Marisol, à borla, na Academia Almadense; de comer hóstias (não consagradas), depois da catequese; de, aos seis anos, ficar tonto pela primeira vez, com um gole de licor de ginja; de me encantar com os "robertos" e com o circo; de me apaixonar pela Célia e pela Fernanda; de querer ir para o seminário; de amar a minha mãe como se ama uma parte de nós, da qual não nos podemos separar sob risco de morte; de rolar pela minha rua abaixo montado no carrinho de rodas de esferas do meu amigo Fernando; de ferir muitas vezes os joelhos ou romper os calções com travagens mal calculadas; de uma vez ou outra abrir a cabeça, quando "renávamos" à pedrada com uns gajos que não eram da nossa rua, e sujeitar-me às inevitáveis chineladas da minha mãe – exasperada – quando chegava a casa feito um Cristo com uma coroa de espinhos.
Lembro-me, inclusive, do campo de trigo ali tão perto e do vermelho vivo das papoilas. O mesmo campo onde, todos os anos, depois da ceifa, se fazia a feira popular de Almada, salvo erro por altura dos santos populares. Dava-me um gozo do caraças ver os homens a montar os carrosséis, as barracas de comes e bebes e outras diversões. No meio desta excitação, provocada por este e outros eventos festivos onde houvesse foguetório, tinha um medo declarado do seu barulho e olhava para o céu com receio de que alguma cana me caísse em cima.
Lembro-me de algumas alturas em que o meu pai chegava a casa já noite tardia, com um grão na asa, e mesmo que eu já estivesse a dormir, tinha de me fazer um mimo antes de recolher a vale de lençóis.
Lembro-me de a minha mãe ter-me levado consigo à praça, num dia em que houve um acontecimento dramático: o dia do atentado contra o presidente Kennedy. Lembro-me de, nesse mesmo dia, um homem ter passado por nós, lançando um piropo à minha mãe.
Também me lembro dela me dar banho no quintal, no tempo quente, dentro do tanque de lavar a roupa; de um sapo de estimação, chamado Jacob, que frequentava o nosso quintal; de colher tomates maduros do tomateiro e comê-los assim, sem mais aquela; de comer figos verdes e ficar com os lábios rebentados; da força das mãos secas e calejadas da minha avó Maria; da sua voz forte e grossa e simultaneamente apaziguadora quando, cantando, me tentava adormecer...
São tantos os fragmentos de memória que me percorrem o pensamento que me é impossível descrevê-los por ordem cronológica. As lembranças avançam e recuam, a um ritmo caótico.
E aqui as deixo registadas (para quem gostar de as ler) porque não sei se consigo mantê-las nos próximos tempos. Algumas são marcantes e outras triviais, mas todas têm a mesma importância que me merecem os saudosos episódios da minha infância.
Mais haveria para contar, mas não me quero alongar. O pano de fundo foi sempre a minha querida rua. Ainda me lembro do seu primeiro nome: Rua Fernão Mendes Pinto. Até o topónimo, algum vereador idiota, se lembrou de trocar por outro, um dia, em plena democracia...
Contudo, e a propósito de mais uma deliciosa crónica de "BB", e mesmo tendo "partido um dia para uma viagem sem regresso", também tenho a minha rua na alma. E vai permanecer até morrer. Depois logo se vê...
 
João Brito
 

Autoria e outros dados (tags, etc)

ZONA ECONÓMICA EXCLUSIVA

por João Castro e Brito, em 06.05.24

Fontes próximas do governo provisório da AD, garantem a pés juntos que o novo ministro da Agricultura e Pescas dará, a breve trecho (se tiver tempo), uma conferência de imprensa subordinada ao tema: "Vigilância nas 200 Milhas Marítimas da Costa Portuguesa."
Nesta hipotética conferência – ainda segundo as mesmas fontes (pouco seguras) – pensa-se que o dito ministro virá na disposição de recusar responder às perguntas dos jornalistas, dado que, como não sabe nadar, não se sente como peixe na água, podendo assim sentir-se inibido para dar respostas cabais.
Especula-se, no entanto, que em consequência da actual escassez de meios de vigilância na nossa zona económica exclusiva, por insuficiência de corvetas, tal acção preventiva poderá vir a ser executada interinamente por corvinas pescadas e previamente adestradas, unicamente dentro das águas territoriais nacionais. Solução havida de último recurso, devida à pouca abundância de carapaus de corrida nas águas costeiras.
A propósito desta questão tão essencial como fundamental (passe a redundância, mas é só para encher isto), aqui há tempos foi feito um inquérito à comunidade piscatória da Charneca do Lumiar (também eu não acreditava, é verdade!), tendo-se apurado que apenas 10 por cento das pessoas inquiridas sabia o significado de ZEE (Zona Económica Exclusiva); 22 por cento pensou que era uma referência à CEE, mostrando-se até surpreendida com a "ousadia" da inquirição, por a considerar despropositada e fruto de uma inconcebível ignorância; 44 por cento, ao ouvir pronunciar a sigla ZEE, disse duvidar que se consiga vigiar seja o que for, e foi mais longe ao acreditar que o peixe vai todo por água abaixo; e que não vale a pena pregar aos peixes; e que vão lá vender o peixe pra outra praça; e que o que eles querem é fazer render o peixe, et cetera; 24 por cento não respondeu com receio da (ex) PIDE/DGS (Polícia de Intervenção e Defesa do Estado/Direcção Geral de Segurança).
Finalmente, dos 10 por cento de pessoas informadas, 9 por cento chamou à ZEE, Zona Exclusiva de Estrangeiros.
Se ainda sobrar tempo ao ministro, pode ser que se debruce sobre o plano estratégico da PAC (Política Agrícola Comum)...

Autoria e outros dados (tags, etc)

CATARINA SALGUEIRO MAIA

por João Castro e Brito, em 25.04.24

"Sou uma portuguesa desapontada com o meu país. Não com os governantes, mas com aquilo que fizemos, ou não fizemos, por ele.
A minha mãe disse-me, ontem, uma coisa maravilhosa ao telefone: "Se todos fizermos um bocadinho por Portugal, Portugal vai para a frente." É a realidade. Se todos lutarmos um bocadinho, é tudo mais fácil. Porém, não sinto isso. Sinto que o povo português reclama, aponta o dedo, mas não faz nada pra mudar as coisas; não é capaz de dar a sua quota parte para mudar o rumo do país.
Os sucessos que temos tido são insuficientes. Portugal não é feito de campeonatos da Europa nem de Festivais da Canção – quem ganha tem todo o mérito, mas precisamos de mais. Temos de evoluir em mais áreas. Revelar que também temos uma ciência digna de mérito e prémios. Precisamos de mostrar que temos escritores fantásticos, cineastas maravilhosos – que existiram e existem, mas não são reconhecidos.
Parece-me que regredimos, um bocadinho, ao tempo do Salazar – Fátima, futebol e festival (em vez de fado).
Portugal não é isso ou, pelo menos, não é só isso.
Somos um país riquíssimo em muitas áreas e queremos ser reconhecidos como tal.
Se o meu pai estaria, hoje, desapontado? É difícil responder por ele. O meu pai, tal como tantos outros, abriu uma página nova para melhorar Portugal; lutou para dar aos portugueses aquilo que eles, em parte, não souberam manter, que foi o cimentar de uma sociedade mais equitativa.
Talvez ele estivesse – se fosse vivo – desapontado com a falta de iniciativa que temos enquanto cidadãos.
Por outro lado, talvez estivesse satisfeito pela meia dúzia de pés descalços que tentam lutar, que tentam investir no país (mas que muitas vezes têm de sair).
Portugal é conhecido pelos portugueses que pegaram nas suas ideias e levaram o nome de Portugal mais além. Isso iria fazê-lo orgulhoso, por ter ajudado a que tal fosse possível. Eu acho que ele não estaria desapontado a 100%, mas com algumas coisas, sim.
Tinha sete anos quando ele morreu, tenho boas lembranças: lembro-me das festas, de brincar com ele, de irmos para a praia e de me tentar ensinar a nadar. A minha mente bloqueou a doença do meu pai, ele também nunca nos transmitiu que estava a sofrer. Tenho a imagem da última vez que o vi no hospital antes de morrer; é a única lembrança má. O resto, é tudo bom. Era um pai maravilhoso."
 
Catarina Salgueiro Maia, entrevistada pela jornalista Leonete Botelho do jornal Público, em 2017, no Luxemburgo, para onde a filha de Salgueiro Maia havia emigrado em 2011, antes do "escalvado" ter convidado os portugueses e as portuguesas a "ganharem experiência no estrangeiro” – justiça lhe seja feita por, pelo menos, a filha de um Homem de Abril ter tomado essa difícil decisão, sem esperar pelo "atento" conselho desse ex-primeiro ministro de má memória. Isto porque a Pátria tem sido sempre uma madrasta para muito boa gente e uma amenista para a malandragem, no que parece ser, desde tempos imemoriais, uma "inevitabilidade"...
Divaguei... Mas, continuando:
Afinal, Catarina ficou órfã de um herói de Abril que a maldita doença, nas suas manifestações mais imprevistas e sórdidas, a deixou, prematura e involuntariamente, menina, e também a nós que pouco o chorámos, mal agradecidos que somos.
E outros heróis se lhe seguiram – também desaparecidos das nossas fracas memórias – , protagonistas daquela fantástica madrugada que nos devolveu um país livre de grilhões. Felizmente, alguns ainda estão vivos, mas igualmente esquecidos.
Vou amar, até morrer, estes intrépidos capitães que restituíram a liberdade à minha Pátria.
Daqueles e daquelas a quem legaram a tarefa de pugnar por essa essencial condição, a história louvará quem a executou em prol do bem comum e julgará quem se aproveitou, ilicitamente, da esperança que depositámos num dia como este há 50 anos.
Assim o espero. Mesmo que morra sem ver a ascensão de uma "Nação valente e imortal"...

Autoria e outros dados (tags, etc)

PÕR AS BARBAS DE MOLHO

por João Castro e Brito, em 19.04.24

barbas de molho1.jpg

É mais um lugar comum cuja origem se perde no tempo.
As pesquisas que levei a cabo, na Wikipédia – convém, sempre, valorizar a preciosa ajuda desta excelente enciclopédia multilingue, online – , foram muito laboriosas, como não podiam deixar de ser e não me pergunte porquê, porque não sei ou por outra: porque sim, prontos (que me desculpe aquela pessoa muito querida que abomina a expressão "prontos").
Contudo, penso que valeu a pena, dado que, após várias análises, minuciosas e abrangentes, cheguei à conclusão de que a frase "pôr as barbas de molho", data do interregno e consta ter sido criada para aludir a uma personagem supostamente muito regrada da nossa História: Dom João das Regras. Isto, sem embargo de outras opiniões, contraditórias, que afirmam o contrário (óbvio), dizendo que o senhor, afinal, era uma pessoa muito desregrada. Vá-se lá saber; e agora também já é tarde.
Mas, você, certamente, já havia adivinhado de quem se tratava e eu estou para aqui a gastar o meu latim pro boneco. Sem ofensa porque não o considero um boneco. Ainda se fosse uma boneca, vá que não vá!
Apesar destes considerandos de natureza geral, estou a ver que qualquer dia sabe mais de História do que eu! Era o que me faltava!
Mas, como ia a dizer, posso provar que tudo o que foi escrito sobre Dom João das Regras é uma falácia completa. Com efeito, "das Regras" não passa de um apelido e, como não me canso de repetir, os apelidos valem o que valem e a mais não são obrigados.
Portanto, DJR (para não perder tempo a escrever Dom João das Regras porque é chato e só serve pra prolongar o texto, já de si entediante, como já deve estar a constatar), ficará eternamente associado ao período mais profícuo e, por conseguinte, mais brilhante de Portugal, quer se queira ou não; não existe meio termo. Ou se quer ou não se quer. Olhe, é como aquela coisa do malmequer (sem assim-assim), está a ver?
Até lhe posso dar o exemplo de um período análogo que podemos estar a viver neste momento: isso mesmo! O período provisório da governação da AD. Você hoje está imparável! Nem sei o que é que estou aqui a fazer, valha-me Deus!
Pois, DJR foi uma figura proeminente desse extraordinário período da História de Portugal, como já tive oportunidade de dizer, e estou absolutamente convicto de que, sem ele, teríamos passado da Primeira Dinastia para a Segunda num ápice e, por conseguinte, sem um intervalinho, sequer, para um café e um bagaço.
Durante esse período tão gratificante, em particular para a monarquia e para o povo em geral, DJR (que usava fartas barbas, conforme os usos e costumes da época), trabalhou afanosamente pra preservar a unidade nacional, fundando, para o efeito, o PUN (não confundir com o "pum" ou flato), Partido União Nacional (actual PPM, ressuscitado pelo PSD).
Em resultado da sua dedicação ao Reino, era muito frequente esquecer as suas obrigações protocolares e até os seus deveres conjugais porque perdia dias e noites a estudar as leis do país de trás pra frente e de frente pra trás. Há quem sustente a tese de que não ia à bola com as leis. Ademais, parece que não era grande amante de futebol.
Do que ele mais gostava era de contar os tostões. E mesmo assim dizia que o dinheiro não lhe chegava para as despesas. No entanto, argumentava sempre que se não fosse ele, isto seria um país sem rei nem roque (embora o rock fosse uma expressão musical ainda desconhecida). E acrescentava – sobranceiro – que nunca se enganava e raramente tinha dúvidas. Manias!
Como era costume destas ilustres personagens do passado, parece que, exceptuando algumas mais sensatas, a generalidade era muito descuidada. E é claro que DJR não fugia à regra. Saliento, a título de exemplo, o caso de Ludwig Van Beethoven, que por acaso nem vem ao caso, mas, em todo o caso, vale a pena referir, se esqueceu de que era surdo e compôs a nona sinfonia sem escutar um único acorde. Ou o caso de Van Gogh que comeu, distraidamente, uma orelha enquanto pintava o seu auto-retrato. Daí, só nos apercebermos da existência da orelha esquerda ao observarmos com muita atenção a famosa pintura. Ou ainda o caso, relativamente recente, do Paulinho das feiras, ex-líder de um partido, também ressuscitado pelo actual governo, que se esqueceu da sua famosa decisão irrevogável, revertendo-a para revogável. Enfim, grandes génios! Há que desculpá-los.
Já para não referir o caso presente do grande "choque fiscal" do Luís Montenegro (ups, já referi!).
Bem, desculpe lá; isto já vai longo e divaguei, o que não é habitual.
E pronto. Para compor esta estória, terminando-a o melhor que posso, dizer apenas que DJR também foi muito bem apanhado, quando, certa noite, sentado à mesa com uma malga de sopa fumegante à sua frente, tão absorto estava nos seus pensamentos que, a páginas tantas, a cabeça lhe deslizou das mãos, mergulhando as barbas no caldo. O acontecimento não passou despercebido ao seu lacaio que, cada vez que DJR adormecia ao jantar desabafava para os seus botões: "pôs as barbas de molho, coitado!"
Existe uma outra versão que se socorre de uma afirmação muito antiga de João das Regras: "Para serem mais honestos do que eu tinham que nascer duas vezes".
Ora, acontece que houve gente mais honesta do que ele, que por sinal até nasceu duas vezes, não se sabendo como, e assim ele teve de pôr mesmo as barbas de molho pra não ficar mal visto e pra não ficar com a cara toda escanhoada, o que era uma desonra para qualquer fidalgo que se prezasse. Verdade ou mito, jamais se saberá, mas também não é relevante para esta estória.

Autoria e outros dados (tags, etc)

DOM AFONSO HENRIQUES

por João Castro e Brito, em 19.04.24

afonso henriques1.jpg

Eh pá, já escrevi tantas vezes sobre o nosso primeiro rei que, qualquer dia, isto pode vir a traduzir-se num caso sério de fixação obsessiva, quase um caso psicossexual, digamos assim.
Para si, que me lê habitualmente com muito prazer e, às vezes, até com alguma condescendência, aqui lhe deixo o meu mais veemente pedido de desculpa porque tenho receio de que estas coisas sejam os primeiros sintomas de TOC (transtorno obsessivo-compulsivo).
Bom, mas como o prometido é devido, penso que aqui há tempos deixei a promessa de analisar certos factos históricos de alguma relevância, como, por exemplo, saber que razão esteve por trás da dramática decisão de Viriato não se ter dedicado à filatelia. Todavia, como nem sempre se cumpre o que se promete, e na esperança de que me perdoe o incumprimento, resolvi voltar à carga com o Fundador da Nação.
Como você sabe, ou pelo menos tem a obrigação de saber, salvo se for ignorante, a Península Ibérica foi invadida por gajada oriunda de muitos lados.
Hunos ou Indivisíveis, Suecos, Visigordos, Energúmenos, Vândalos, Malandrinos, Hooligans e Mao Metanos (não confundir com Mao Istas*), todos eles deixaram as suas pegadas de carbono por aqui.
Os Mao Metanos (gente com fortes distúrbios gastrintestinais), Muçulmanos, Árabes, Sarracenos, Mouros e Jiahdistas, esses, instalaram-se um pouco por toda a parte, como se isto fosse o da Joana, criando praças fortes, como Santarém e Lisboa.
Ora, isto foi um bom pretexto para Afonso Henriques consolidar a sua vontade férrea de ser o dono disto tudo e vir por aqui abaixo feito um desenfreado, cheinho de vontade de dar uma carga de porrada a esta malandragem e, naturalmente, espalhar a fé de Cristo.
Órfão de pai aos três anos e homem de vistas largas, apesar de usar óculos, travou o passo ao filho da puta do Dom Peres (efectivamente, Dom Peres era filho de uma mulher de maus costumes. Isto, de acordo com os padrões morais daqueles tempos; está devidamente documentado nos arquivos históricos da Torre do Tombo), armou-se em cavaleiro de corrida (não confundir com carapau de corrida) e fez-se ao caminho à frente de um numeroso exército.
Chegou muito antes dos outros e tomou Santarém aos Mouros, com a ajuda de um copo d'água. É o que faz a sede de glória.
Pouco tempo depois, tomou Lisboa com a ajuda de muitos escudos e muitas lanças. É claro que com muitos cruzados também. Evidentemente que nada disto nos admira, dado que o cruzado era moeda de troca na altura.
O poder de Afonso Henriques consolidou-se a olhos vistos. A sua fama chegou além fronteiras. De toda a parte choveram louvores. Geraldo Geraldes a todo o vapor e sem pavor, por exemplo, ofereceu-lhe Évora, para perpetuar os seus feitos. Porém, Afonso ficou muito decepcionado com a oferenda, dado que a Praça do Giraldo não passava de um projecto e a cidade estava reduzida a um simples templo romano.
Conflituoso, o nosso primeiro rei, até com o papado teve bate fundos de ferver em pouca água.
A coisa tomou tais proporções que a designaram de "bulha papal".
No decorrer do seu longo reinado, o nosso rei teve tempo pra tudo: derrotou os mouros em Campo de Ourique, após um encontro com um ancião que se havia cruzado com ele, garantindo-lhe que a vitória estava no papo; fundou o Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, ao cimo da alameda com o seu nome, símbolo da sua megalomania, e posou para selos de 5 tostões, comemorativos do seu septuagésimo aniversário (actualmente, fora de circulação).
Contudo, muito fica por dizer a respeito de Afonso Henriques. Pelo menos, por agora. Por exemplo: a sua cota de malha era de pura lã virgem ou era uma merda feita na China?
E o tratado de Zamora? Terá sido assinado em cruz? É consabido que Afonso só tinha completado a quarta classe do ensino primário, e com muita dificuldade, mas lá cristão era ele!...
E mais: teria o senhor a noção de que estava a fundar Portugal (não confundir com "afundar Portugal" que é o que os políticos têm andado a fazer desde o 25 de Abril)?
E a derradeira pergunta: terá Afonso Henriques enriquecido ilicitamente ou também terá sido enganado pelo Ricardo Salgado com a aceitação dos tais 253 mil euros de financiamento do BES?
São perguntas que vão ficar eternamente sem resposta, dado que Afonso I morreu em dezembro de 1185, segundo rezam as crónicas, desconhecendo-se as causas exactas da sua morte, mas sabe-se que contava 76 anos, idade muito avançada para aquela altura, e sofria muito de gota.
(*) Os Mao Istas, vieram a estabelecer-se definitivamente em Portugal, ainda no século XX, contribuindo para a disseminação das famosas lojas dos 300.

Autoria e outros dados (tags, etc)

MEMÓRIAS

por João Castro e Brito, em 26.03.24

Diálogo entre um casal de idosos, trazendo saudosamente à memória, personagens e factos do passado:
Ele: Que bela equipa, a do Benfica, lembras-te? Era o Matateu, o Eusébio, o Peyroteo, o Humberto Delgado...
Ela: Delgado?!...Eh pá, esse era o guarda-redes do Sporting!
Ele: Ah, pois, o do Benfica era o Yaúca!
Ela: Não. Esse era forcado, um sueco alto e loiro. Um pedaço de homem!
Ele: Quem era também do Sporting, era aquele almirante... tenho o nome dele debaixo da língua, porra!... Um que botava discursos a torto e a direito e que se irritava muito c'a malta até q'um dia mandou todos bardamerda!
Ela: Pinheiro de Azevia?
Ele: Não!
Ela: Cruz Abacaxis?
Ele: Também não! Ah, já sei: Arnaldo Matos!
Ela: Estás enganado, esse foi o ministro da Educação que a Natalina Correia apelidou de "o grande educador da classe estudantil!"
Ele: E quem era o Primeiro Ministro, lembras-te?
Ela: Francisco Pinto Balsinha. E o Presidente era o Soares Borrego.
Ele: Esse, se bem me lembro, era um bochechudo, injustamente acusado de ser socialista, n'era?
Ela: Não. Esse era o Jô Soares.
Ele: Mas..., afinal, quem eram as irmãs Meireles, sabes?
Ela: Não faço a mínima ideia!
Conhecia os irmãos Carlos e José Adelino, uns tipos que eram funâmbulos. Havia, também, os irmãos Lia e Jaime Gama, os irmãos Helena e Pedro Roseta, mas Meireles, sinceramente, não estou a recordar. Não seriam aquelas manas fadistas, Amália e Celeste Meireles?... Olha, quem cantava bem o fado era o Carlos Lopes. Que voz tão maviosa, meu Deus!
Ele: Havia, também, o Fialho Correia que fazia o Zip Zap, lembras-te?
Ela: Então, não lembro?! Até parece que foi ontem! Lembro-me até de outro programa que dava na televisão: A Vaca Gabriela, n'era?
Ele: A Vaca Gabriela era uma telenovela com a Sónia Bragança e o Armando Bogas. Faziam uma bela dupla!
Ela: Tempos insólitos, n'eram? Parava literalmente tudo pra ver o senhor Nacib e a Gabriela. Até o parlamento, se estás recordado!
Ele: Tempos também complicados, esses! Lembras-te de um que foi presidente da RTP na altura? Um tal Otelo Proença de Carvalho? Acho q'o gajo era de cavalaria, n'era?
Ela: Penso que não. Aliás, ele morava ali pros lados da Artilharia 1 e até usava monóculo!
Ele: Ah, já sei! Esse do monóculo era um que escreveu um livro intitulado de "Crónica dos Bons Malandros" e foi promovido a Marechal!
Ela: Não. Quem escreveu esse livro foi o Cardoso Pires, durante o seu estado de coma – De Profundis, Valsa Lenta – e quem foi promovido a Marechal foi o Gomes da Costa.
Ele: Olha que não! Estás enganada! Quem esteve em coma De Profundis, Valsa Lenta foi o Mário Zambujinha! E o Gomes da Costa foi o da revolução do Primeiro de Maio de 1926.
Quem foi promovido a Marechal foi o Vasco Gonçalo!
Ela: E o Cheta? O homem era mesmo um chato! E estava sempre a dizer chuta! Quem era ele pra mandar calar a gente?!
Ele: Sim, mas safava-se bem porque estava sempre caído nas revistas do Parque Maior, com belas companhias. Ela era a Vera Lagosta, a Ana Zanata, a Odete Sanches, a Florbela Espanta, a Natalina Correia, a Lili Canelas e sabe-se lá quem mais! Não sei que raio tinha o gajo de especial para atrair tantas mulheres, caraças!
Ela: Porém, foi um tempo que o tempo não apagou porque alguma coisa se aproveitou, não achas?
Ele: Sim, com efeito! Até porque um bife à Trindade custava 60 paus e a pescadinha de rabo na boca estava a 12 "melréis" o quilo.
Mas quem eram, mesmo, as irmãs Meireles?

Autoria e outros dados (tags, etc)

A MAIOR REVOLUÇÃO FUTEBOLÍSTICA DE TODOS OS TEMPOS

por João Castro e Brito, em 21.03.24

árbitro corneteiro.jpg

"Já ninguém ouve o apito!". Foi com esta grave advertência que o representante da Federação djibutiana de Futebol (FDF) abriu os trabalhos da enésima cimeira da FIFA, subordinada à problemática da arbitragem. Aliás, uma questão da maior acusticidade – se me é permitido o termo (escusam de procurar no dicionário porque a palavra mais próxima é "acuidade").
Com efeito, todos os delegados presentes secundaram o grito de alarme da delegação do Djibuti, declarando-se testemunhas de casos extremos em que o ruído produzido pelos adeptos nos estádios, não permite ouvir os apitos dos árbitros.
"Terminou a época dourada do apito (não confundir com o processo Apito Dourado)!" – exclamou, dramático, o delegado da Suécia, Björn Borga, enquanto Tomato Tomaki, do Japão, se pronunciava sobre a diversidade de alternativas tecnológicas disponíveis e perfeitamente integráveis. E lembrou o exemplo concreto do vídeoárbitro.
No entanto, a maioria das federações é defensora da adopção da corneta em substituição do obsoleto apito. "Sempre tem outra ressonância melódica" – disse o delegado alemão, Helmuth Silva, enquanto Jose de Arboleda, por parte da Espanha, sugeriu que os fiscais de linha passassem a usar castanholas, um pouco à margem da questão em discussão. Proposta imediatamente rejeitada por larga maioria das representações presentes.
Se, como tudo indica, a corneta vier a ser adoptada, os árbitros frequentarão cursos intensivos de corneta, no Batalhão de Sapadores Corneteiros da sua área de residência, de modo a poderem tocar conforme as circunstâncias – isto é: em vez do clássico e monótono apito, haverá diferentes tipos de toques, consoante cada particularidade afecta a um encontro de futebol ou seja: toques para o início e fim do jogo; para fora de jogo; para dentro de jogo; para castigo na marca de grande penalidade; para as rasteiras; para as faltas atacantes; para as faltas defensoras; para os golos à boca da baliza; para os golos de baliza a baliza; para os golos de cabeça; para os golos de mão; para os golos com a mão de Deus; para os golos de pé; para os golos de peito; para os goles de cerveja; para os autogolos; para os cantos; para os livres e, finalmente, para a próstata (toques rectais).
"Só assim – afirmou um dos proponentes desta grande inovação – o público não só ouvirá, como saberá, através das notas cornetistas, o significado de cada decisão do juiz de campo."
A propósito: a contar para o campeonato de reservas, defrontam-se, no próximo Domingo, o Reserva Branco do Redondo e o Reserva Tinto de Cantanhede. Para animar os adeptos, prevêem-se bastantes desregramentos e algumas contravenções associadas. Nada a que não estejamos habituados a ver no "desporto rei"...

Autoria e outros dados (tags, etc)

BREVES REFLEXÕES SOBRE HISTÓRIA (Episódio II)

por João Castro e Brito, em 19.03.24

cristóvão colombo.jpg

Na história, nada acontece por acaso. Todos os factos têm as suas interligações e os seus antecedentes lógicos. Isto até pode parecer uma banalidade ou algo que você já leu ou escutou em qualquer lado, mas vou tentar explicar como a importância de lugares comuns como este, pode transcender a nossa compreensão.
Imagine, por exemplo, se tivesse sido da Vinci a inventar a marmita de Papin; ou Newton a estabelecer o princípio de Pascal; ou Vasco da Gama a fazer a primeira viagem de circum-navegação. Onde ficaria isto tudo? Onde ficaria ou como seria, por exemplo, o estreito de Magalhães? Chamar-se-ia estreito de Magalhães? Provavelmente seria conhecido por estreito de Gama...
Ou se fosse Bertolt Brecht a inventar as pancadinhas de Moliére? Ou, ainda, a chef Cátia Goarmon a explicar, na 24Kitchen, como se faz uma salada de bacalhau salgado desfiado à mão (vulgo a dita cuja)? Ou se Bonaparte tivesse nascido no Egipto, filho de um humilde pescador do Nilo, e tivesse seguido as suas pisadas? Provavelmente, as invasões francesas não teriam existido e Junot, Soult e Massena não teriam levado a cabo milhares de acções de confisco, saque e destruição do nosso património cultural, jamais devolvido; e a Família Real Portuguesa não teria fugido para o Brasil, com o rabinho entre as pernas, deixando os portugueses entregues ao seu trágico destino; e não teriam entrado em Portugal os ingleses (outros saqueadores que tais), sob pretexto de expulsar os franciús, ao abrigo da "Mais Antiga Aliança do Mundo". Se bem que, sem as invasões francesas, Brites de Almeida seria, historicamente, uma ilustre desconhecida.
Até pelo exemplo da padeira de Aljubarrota, continuo convicto de que, na história, tudo é fruto do destino.
Ao contrário do que se pensa, Cristóvão Colombo não descobriu a América por acaso, mas antes por engano. E o que é o engano a não ser o destino? Calma que eu explico:
Diz-se que quando pisou o solo do Novo Mundo, pensou que tinha chegado à Índia. E porquê? – pergunta você com toda a legitimidade – Porque quando viu tanta gente desnuda e de pele vermelha a vir ao seu encontro, decidiu, ali mesmo, apelidá-la de índia. É claro que incorreu num equívoco, mas o que seria de Billy The Kid, Búfalo Bill e até do Grande Chefe Apache, Geronimo, se Colombo não se tivesse enganado? Ou se tivesse chamado americanos aos índios, como se chamariam, hoje, os americanos?
Regressemos à nossa História: Suponhamos que o 25 de Abril foi em Agosto. Como poderíamos falar dos Capitães de Abril?
E se os capitães fossem generais? Ou notários? Ou até mesmo carteiros? Soaria muito mal dizer-se que os Carteiros de Abril tinham derrotado o regime de Caetano em Agosto. Isto, sem desprimor para a nobre e quase extinta profissão de carteiro.
Pior soaria se Caetano se chamasse Óscar. Já pensou quão feio constaria se se tivesse derrubado um regime oscarista? Mesmo se, no caso, os capitães fossem carteiros e o 25 de Abril fosse em Agosto, hã?! Está a ver?
Suponhamos, agora, que Spínola era um autóctone australiano. Como poderia o senhor ter participado no 11 de Março? E se os acontecimentos de 11 de Março tivessem ocorrido nas montanhas dos Himalaias? Ou se os capitães fossem delegados de propaganda médica? Se o 25 de Abril fosse em Fevereiro? Se Caetano fosse José Vitalício Barbosa, caldeireiro, que não é tido nem achado nesta história? Se Afonso Henriques nascesse daqui a uma semana? Se Cavaco Silva fosse um parente afastado do Nosferatu? Se Cristóvão Colombo tivesse achado a Ilha da Madeira, ao invés de João Gonçalves Zarco, Tristão Vaz Teixeira e Bartolomeu Perestrelo? Se Dom João VI tivesse pedido asilo político aos Camarões?
Como certamente inferiu, o encadeamento dos factos, às vezes, é difícil, mas a história também nunca foi fácil, n'é verdade? Olhe, o CC que o diga! Por isso é que teve uma vida curta, coitado! Dizem que foram desgostos de amor...

Autoria e outros dados (tags, etc)


Mais sobre mim

foto do autor


Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.


Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2016
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2015
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2014
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D